sexta-feira, 24 de julho de 2015

Saudades em forma de desabafo

Aviso: este texto foi escrito num estado de espírito assim a puxar para o melancólico-depressivo, que de vez em quando é uma coisa que também nos faz uma certa falta. Toca a sacar do Kleenex (ou do lenço de papel do Continente, para os mais poupadinhos) que isto vai ser de puxar à lágrima e, consequentemente, ao ranho. Ou então não, estou a exagerar. 

Ora, então, cá vai:

Quando emigrei, senti que estava a pôr a minha vida em modo pausa. Mas não há pausas, pois não? O tempo não pára de correr. De correr? De voar, seria mais exacto. Parece que foi ontem e já lá vai mais de um ano. Sinto que perdi tanto. Mas também sei que se estivesse em casa não ia estar a aproveitar coisa nenhuma, por não ter meios, tempo ou, simplesmente, cabeça para isso. Tenho saudades de tudo. Literalmente, de tudo. É uma saudade que nem se consegue pôr por palavras, daí terem arranjado a palavra "saudade", tão portuguesa, para resumir um sentimento que não pode ser descrito, quanto mais resumido. Não posso dizer que ande aqui a chorar pelos cantos, sofrer torna-se parte da rotina e uma pessoa acaba por já nem se dar conta de que não está bem. O silêncio torna-se um companheiro fiel e os dias vão desfilando, uns a seguir aos outros, sem grandes tumultos. O tempo vai passando e a vida vai-se vivendo, confortavelmente. Mas, de vez em quando, e por muito agradável que seja a nossa existência cá fora (que, vamos ser sinceros, até é) é inevitável questionar tudo.

Faltam menos de duas semanas para sentar o meu rabo no banco dum avião da TAP rumo a casa (estou a avisar, TAP, que se alguma coisa corre mal, mesmo que sejam só 5 minutos de atraso, o aeroporto vem abaixo) e não consigo deixar de me sentir frustrada. É muito giro viver num país que não é o nosso, "ah é uma experiência nova, vais conhecer novos costumes e vai ser fixe e cenas". Sim, visto por esse prisma até é interessante. Mas, depois, há o outro lado da moeda. Uma coisa era estar a viver no estrangeiro porque "olha, hoje acordei com os pés de fora e apetece-me", mas saber que a qualquer momento podia voltar. Outra coisa, e completamente diferente, é estar aqui, ter vontade de estar lá e não poder. Poder, podia. Mas para viver que vida? Não poder pagar uma renda, como tanta gente? Não saber se no dia seguinte ia continuar a ter trabalho? Ter medo de pedir uma folga, quanto mais umas férias?  Às vezes, sinto-me como o tolinho no meio da ponte. Não estou bem aqui porque me falta tanta coisa. Falta-me o meu amor, a minha família, os meus amigos, os meus lugares e as minhas coisas, as minhas comidas, falta-me tudo o que alguma vez conheci. E aí penso "bem, às tantas era melhor voltar". Mas voltar para fazer o quê? Voltar para trabalhar horas que nunca acabam a troco de pouco ou de nada? Ou não trabalhar de todo, como tanta gente, e já mais perto dos 30 que dos 20 ter que voltar a pedir dinheiro aos meus pais para poder ir tomar um café? Trocar o trabalho e o salário que tenho aqui, a estabilidade financeira, a oportunidade de viajar, de realmente ter uma vida, de juntar dinheiro, para voltar para um país sem futuro, sem presente, sem porcaria nenhuma? E nem me vou alongar mais, que se a conversa vira para os recibos verdes ou para os estágios profissionais, vou estar aqui a escrever até ser Agosto.

Vou acabar isto a dizer que quando leio as notícias, nem sei se hei-de rir ou de chorar. Tanta areia que nos atiram para os olhos, senhores, tanta areia. Tanta produtividade, tanto emprego, tantos estágios, tanto empreendedorismo (a minha palavra preferida). Dinheiro é que é só para as carteiras de meia dúzia. A maior parte sobrevive "à rasca" e o país continua líder, mas é na exportação de gente. Verdadeiro terceiro mundo.

E isto é tudo tão frustrante! Porquê, porque é que não havemos de poder ter boas condições de vida no país onde queremos estar? Se o país onde querem estar não for o vosso então, parabéns, ser português é, efectivamente, a nacionalidade certa para vocês. Acho que as crianças deviam tirar o cartão de cliente frequente da TAP juntamente com o cartão de cidadão, que é para se começarem a habituar à coisa. Mas, para nós, que dávamos um rim pela oportunidade de termos uma boa vida em casa, isto é tudo uma grande merda porcaria.


15 comentários:

  1. Tenho bastante tempo pela frente, bastante como se ele não fosse passar a voar, até chegar à tua situação. Sinceramente nem acabei a secundária, nem sei que curso quero tirar e já sei que em Portugal dificilmente fico, é preciso vir o papa para que eu cá fique. Simplesmente o país onde vivemos não nos oferece o que queremos, tenho orgulho em dizer que sou Portuguesa, mas já tive muito mais do que agora tenho.
    Beijos e quase que me fizeste ir as lágrimas com o que escreveste.
    http://mariacrescida.blogspot.pt/

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    1. Não deves deixar de ter orgulho em ser portuguesa, certos portugueses é que deviam ter vergonha de terem deixado as coisas chegarem ao estado a que chegaram.
      Obrigada pelo comentário, gostei muito (=

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  2. Geralmente quando se fala em ir para fora, nunca se pensa na parte negativa. É sempre muito bonito pensar no país novo, os costumes, e todas as coisas que referiste. O pior é mesmo quando a saudade aperta. Se o máximo de tempo em que estive fora de Portugal foi uma semana, e no final já sentia falta das minhas coisas, nem consigo imaginar o que estás a passar. Mas tens toda a razão, não vale a pena voltar. Por aqui a exploração foi instalada e já nem um curso é sinónimo de empregabilidade. Uma tristeza.

    Ricardo, The Ghostly Walker.

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    1. Sonho com o dia em que a exploração seja "desinstalada", embora não o consiga ver a chegar num futuro próximo...

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  3. Incomoda-me saber que daqui a uns anos posso ser eu a repetir as tuas palavras. E não queria. Estou a formar-me no meu país, a deixar dinheiro no meu país e depois é esse país que me vai deitar ao lixo. Acho que descreveste a emigração na perfeição. Acredito que toda a gente pense que é uma pausa. Porque é para ir fazer umas coisinhas e é rápido e já voltamos. Mas não é assim. E o tempo passa. :/

    Isa,
    http://isamirtilo.blogspot.pt/

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  4. Como te compreendo... É mesmo muito frustrante o nosso país não nos poder dar as oportunidades que merecemos... Em breve também serei eu a fazer as malas e a partir... cada dia me parece mais inevitável e próximo...
    beijinhos
    http://direitoporlinhastortas-id.blogspot.pt/

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  5. Enerva-me profundamente quando vêm os governantes deste país dizer que estamos no bom caminho. Parece que vivem numa realidade paralela à maioria dos portugueses.
    Muita força Sofia.

    http://thesunnysideoflifeblog.blogspot.pt/

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  6. Como te percebo, acho que só mesmo quem passa por isto é que sabe o quanto custa!!

    http://fashionwalkinbrussels.blogspot.com/

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  7. Pouco que te conheço mas a frustração é muito forte
    mais deve ergue a cabeça e segui.
    Canal:https://www.youtube.com/watch?v=eNNlFtDc1-o
    Blog:http://arrasandonobatomvermelho.blogspot.com.br/

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  8. Bom post. Reflecte aquilo que muitos emigrantes sentem.
    Ao contrário de ti, eu sempre quis viver no estrangeiro. Esse foi provavelmente um dos meus maiores sonhos durante toda a minha adolescência. E por isso quando surgiu a oportunidade, assim de repente, não pensei duas vezes antes de fazer as malas e apanhar o avião. Algo que no entanto nunca me ocorreu, nem na adolescência nem aos 20 (quase 21) quando deixei o meu país, foi não ter a oportunidade de voltar sem ter que andar a pedir trocos aos meus pais. E é isso que me chateia - a falta de opções, de oportunidades. Já pensei várias vezes em voltar mas não me atrevo. E sinceramente às vezes sinto que sou uma espécie de exilada. Beijinhos e força :)

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    1. A partir do momento em que nos tiram a opção de voltar, somos todos uma espécie de exilados... mas há que ter esperança! E força, como disseste.
      Beijinhos

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    2. A partir do momento em que nos tiram a opção de voltar, somos todos uma espécie de exilados... mas há que ter esperança! E força, como disseste.
      Beijinhos

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  9. Como me revi nas tuas palavras... Custa tanto sentirmo-nos "obrigados" a estar aqui... Sim, porque vamos voltar para o quê? Em Portugal não há nada para os que lá estão quanto mais para quem queira voltar... Revolta-me tanto... Custa tanto... Beijinho querida!!

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  10. A tua última frase diz tudo. Revi-me tanto neste texto. Uma coisa é viajar para conhecer, ou emigrar por que se quer (novas experiências,etc), outra é vermo-nos obrigados a isso...

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    1. Sim, são coisas completamente diferentes... escrevi este texto há quase um ano e continua super actual (para mim, pelo menos)

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