É que uma pessoa não sabe se há-de rir ou se há-de chorar!
Está um trabalhador a recibos verdes feliz e contente na sua vidinha, a achar que não há mais nada que lhe possa acontecer (sejamos sinceros, ser trabalhador a recibos verdes é mais-ou-menos como bater no fundo), quando nos aparece um iluminado que consegue mudar ainda mais a nossa maneira triste de ver o mundo!
Senão, vejamos: um trabalhador independente (ah ah ah, independente... hilariante) não tem estabilidade nenhuma, pode ser despedido de um minuto para o outro com uma justificação como "você veste-se muito de amarelo às bolinhas e eu não gosto de amarelo às bolinhas, gosto mais de cor-de-rosa às riscas" ou até sem justificação nenhuma, não podemos ficar doentes, não podemos tirar férias (porque não recebemos e porque quando chegarmos não há trabalho para ninguém). Por outro lado, não podemos ser obrigados a cumprir um horário de trabalho e temos direito a deixar de trabalhar quando nos der na cabeça. Mas, claro está, que na realidade somos obrigados a trabalhar como recibos verdes ilegais, a cumprir horários ridículos, somos impedidos de tirar férias (sim, bater o pé e lutar pelos nossos direitos, muito bonito... mas uma semana de férias nas Berlengas não vale o desemprego), somos basicamente tratados como se o único propósito da nossa vida fosse estar ali de pernas abertas à espera de termos a oportunidade de satisfazer todas as necessidades de quem manda. E quando uma pessoa vê a luz ao fundo do túnel (leia-se: no estrangeiro, nesse mundo civilizado que diz por aí que existe) e, mesmo contra todas as regras do bom senso, tenta ter consideração pela pessoa para quem trabalha e dar um pré-aviso razoável, de duas semanas, ao qual não é OBRIGADO porque tem o direito de se pôr na alheta quando quiser, ainda é insultado e tem que ouvir pérolas como "porque você é obrigado a dar um mês à casa" e "cada um é que sabe como é que apresenta a consciência a Deus".
Ora, vamos lá por partes...
Primeiro: OBRIGAÇÃO a dar um mês à casa? Oi? Foi muito grave o acidente? É que o senhor não está a dizer coisa com coisa! Os recibos verdes não são só para o que lhe dá jeito! Não há obrigação nenhuma de nada, por lei temos direito a pegar nas nossas coisinhas e a sair porta fora sem darmos sequer pré-aviso nenhum. Não está bem com isso? Faça contratos. Pois, não quer, não é? Então cale-se e embrulhe.
Segundo: a minha consciência está de boa saúde e recomenda-se, muito obrigada pela preocupação. E a sua? Como é que está, depois de ter ameaçado com o despedimento uma funcionária que foi parar inconsciente ao hospital por excesso de trabalho? Tenho quase a certeza que Deus não deve ter gostado muito de o ouvir dizer "Eu cá não acredito em esgotamentos, isso é o que os médicos dizem quando não sabem o que se passa. Se está assim tão cansada, pode ser que eu lhe dê o descanso de vez!". Então e como é que anda a sua consciência agora que anda a ser processado pelas pessoas a quem não pagou o que devia? E por se comportar como um autêntico canalha, que não respeita nada nem ninguém? Isso não lhe pesa na consciência, mas a mim tem que pesar o facto de "só" lhe ter dado duas semanas de pré-aviso, simplesmente porque me apeteceu ter consideração por si? (Eu sou tão burra. Burra, burra, burra). Olhe, mais engraçado que isso, só se me dissesse que me ia pagar subsídio de Natal!
E pronto, são os patrões que temos e é este o país que temos. Um país que se preocupa muito em discutir praxes, mas que é roubado e humilhado todos os dias e baixa a cabeça e continua alegremente a acatar ordens. E contra mim falo.
Andei 3 anos a trabalhar a recibos verdes, exclusivamente numa só empresa, com horário "fixo" de 8h e muitas horas «extras». Quando era conveniente lembravam-me da obrigação de estar lá das 9h às 18h. Mas logo a seguir eu já era um trabalhador independente com obrigação de trabalhar a qualquer hora, até de noite. Cheguei a trabalhar 13 horas consecutivas.
ResponderEliminarMas quando percebi que andava a pagar para trabalhar e me encontrava desanimada com a rotina e principalmente com a maledicência de alguns colegas, vim embora.